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quarta-feira, novembro 24, 2010

CINCO REFLEXÕES SOBRE A GREVE GERAL

1.

Proclamar, com cara mais ou menos circunspecta, que sim senhor, se deve respeitar o direito dos trabalhadores em fazerem greve, e de aderirem à greve geral, é obviamente pouco mais que um verdadeiro truísmo, ou uma verdade de La Palice.
É mais que óbvio que qualquer cidadão tem esses direitos, de resto consagrados em normativo constitucional. Só um tolo poderá colocar isso em dúvida. É assim, forçosamente, numa democracia como aquela em que escolhemos viver, a que alguns apelidam de “burguesa”.
Não deixa de ser curioso e muito irónico que alguns dos mais denodados defensores da greve geral, enquanto manifestação de protesto de quem trabalha, sejam igualmente empenhadíssimos defensores (ou pelo menos como tal se apresentam ou fingem…) de um modelo político de sociedade, que se acaso estivesse implantado entre nós, não permitiria protestos, nem manifestações de indignação, nem greves. Nem greves gerais, nem qualquer outro tipo de greve, qual quê!….

2.
Uma greve geral, num contexto de maturidade cívica como ficou demonstrada hoje, não inorgânicamente promovida e conduzida, enquadrada por organizações sindicais com peso e responsabilidade institucional, poderá indiciar a existência de pulsões suicidárias mais ou menos inconscientes. Mas, por outro lado, poderá pelo menos servir como meio de “descarregar” tensões, cóleras, furores, frustrações e indignações acumuladas na psique colectiva.
As quais se compreenderão, no actual cenário sócio-político, face aos grandes sacrifícios que se anunciam, e face à derrocada das miragens e ilusões que durante anos a fio andaram a ser “vendidas” por dirigentes e por responsáveis políticos.
Será algo de semelhante ao que por vezes acontece quando alguém, atingido por um contratempo, ou uma desgraça, descarrega em casa dando uns pontapés e uns murros a uma mesa, ou partindo umas quantas peças de louça. A “descarga” alivia-o e faz-lhe bem.

3.
No tocante à dolorosa crise económica e social que se sente e de que se fala, a procissão ainda vai no adro. Por enquanto, os cortes salariais, os aumentos dos impostos, as retiradas de subsídios, os aumentos de desemprego, o fecho e falência de empresas, os sacrifícios, enfim, ainda estão no domínio do programado e do anunciado. Veremos como será daqui a uns 2 a 3 meses, lá para o final de Janeiro, a que mais sérias explosões e expressões de indignação, de cólera e de frustração iremos assistir.
Se o psique colectivo não resistir às ditas pulsões suicidárias, e como estamos todos a caminhar sobre uma camada de gelo muito fino, não será difícil imaginar o que poderá vir a ocorrer.

4.
Uma greve dita geral como a de hoje, é sobretudo uma greve geral dos transportes (na sua grande maioria a cargo de empresas públicas) e do conjunto do funcionalismo público. São, há-de reconhecer-se, aqueles a que maiores e mais dolorosos sacrifícios estão a ser anunciados. Parados os transportes, por adesão livre e consciente dos respectivos trabalhadores, ou como consequência do seu desejo de não quererem criar conflitos ou problemas com os seus colegas, todo o país marcha a meio gás, se não mesmo a menos.
De resto, numa empresa como o Metropolitano de Lisboa, por exemplo, bastaria que uma dúzia de trabalhadores da central de comando fizesse greve, para que toda a circulação de comboios do Metro ficasse paralisada.

5.
Terminado o dia da “greve geral”, amanhã começa um novo dia. Não estou a ver que algo vá mudar, pelo menos para o lado positivo. O que para aí se vai dizer, em jeito de gritos de vitória, será tão só conversa de treta. Por muitas culpas que lhe possam caber, por termos chegado ao estado a que chegamos, a margem de manobra deste Governo, como de qualquer outro que queira e o venha a substituir, é extremamente reduzida. E seria reduzidíssima, microscópica, se fosse, por exemplo, um governo presidido pelo deputado Jerónimo de Sousa com o deputado José Pureza como ministro das finanças…
Em todo o caso, e se ficarmos por aqui, o protesto social em Portugal passará para o exterior com uma imagem de muito menos violência que o ocorrido na Grécia ou em França. Já não será mau, e os chamados “mercados”, ou seja os nossos credores, não deixarão de reparar nisso. Talvez não se deixem assustar nem duvidar tanto da nossa capacidade de virmos a pagar o cacau que nos emprestam.

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