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sábado, julho 31, 2010

HAVEMOS DE IR A FOZCOA

Ligam-me a Fozcoa ( antes Vila Nova, agora cidade...) afectuosos laços familiares. Desde a primeira hora, sempre achei que a decisão de cancelar a construção da barragem de Fozcoa, por causa das gravuras, foi um irresponsável disparate, provocado pela pusilanimidade de alguns governantes, incapazes de resistir ao tráfego de influência do poderoso lobby dos arqueólogos, traduzido, por exemplo na grande berraria mediática que na altura conseguiram que se fizesse.
Foi prometido então que o parque das gravuras iria trazer centenas de milhar de visitantes por ano, se não mesmo milhões. O parque haveria de ser como um autêntico Eldorado para Fozcoa. Assim o anunciaram personalidades tão ilustres e hoje tão bem colocadas na vida como Jorge Coelho e Manuel Carrilho.

Quinze anos passados, é muito grande a frustração das gentes de Fozcoa, que se sentem ludibriadas pelo embuste de que se consideram vítimas.
Números oficiais, ontem divulgadas pela comunicação social, são de que o parque arqueológico do vale do Côa (PAVC) receberia anualmente cerca de 20 mil visitantes. O número está mesmo assim empolado, porventura com o intuito de minimizar um bocadinho a dimensão do flop e do embuste.
Segundo estatísticas que obtive directamente do PAVC, os números totais de visitantes foram de 17953 em 2008, e 18113 em 2009 . Mas os visitantes que se deslocaram realmente a ver as gravuras aos longínquos locais onde se encontram, foram apenas de 12956 em 2008, e de 12760 em 2009. O resto, trata-se fundamentalmente de alunos de escolas que por ali foram e são entretidos com umas actividades lúdicas e ditas culturais .

Nunca visitei o PAVC propriamente dito. O que dele sei, devo-o a testemunhos fidedignos de amigos que já tiveram a coragem de o visitar, em penosas viagens de jeep, por entre caminhos poeirentos de terra batida, e tendo por vezes de suportar um calor tórrido provocado por um sol abrasador que o torna inclemente. Lá chegados, o guia coloca uns transparentes sobre as rochas com inscrições e incita os desapontados visitantes a verem ali os traços de uma cabra, de um cavalo, ou de um auroque.

O PAVC emprega um total de 29 funcionários públicos. Há 9 guias destacados para acompanhamento dos visitantes. Já foram 16 . Cada guia pode fazer, teoricamente, 3 viagens por dia, em jeeps levando cada um 8 pessoas. Nestas condições, as gravuras do PAVC poderiam receber, no máximo, entre 50 e 60 mil visitantes por ano. São visitadas por cerca de 20% desta capacidade. Avalie-se daí a taxa de ocupação daqueles 29 funcionários públicos.

Tendo custado 18 milhões de euros, foi ontem inaugurado um museu do Côa. Com pompa, circunstância e muita treta. Agora é que vai ser, agora é que nasce uma nova esperança, agora é que Fozcôa vai ser inundada por milhares e milhares de visitantes, é de novo anunciado.
No museu, há réplicas das gravuras. Afinal, podiam neste mesmo museu ficar guardadas, conservadas, protegidas e exibidas, não as pindéricas réplicas, mas as pedras autênticas, com as gravuras autênticas. O efeito educativo e cultural era muito superior, com extensão a muitos mais milhares de pessoas do que as escassas dezenas de milhares que a essas pedras e gravuras acabam por ter acesso.
E tinha-se construido a barragem, produzindo energia eléctrica, armazenando uma reserva estratégica de recursos hídricos que tanta falta pode fazer no futuro, proporcionando água às sequiosas terras de Riba Côa, cuja agricultura poderia vir a ser revitalizada através de regadio, criando riqueza local, contribuindo para reduzir a dramática desertificação das ditas terras. E, porque não, permitindo o desenvolvimento de turismo num enorme lago em região de micro clima semelhante ao mediterrânico.

Mal termine o tempo caloroso deste Verão, vou fazer de novo uma re-visitação a Fozcôa.
Não sei se me atreverei a uma dura viagem de jeep pela vastidão inóspita daquelas montanhas e ravinas. Pelo menos visitarei o Museu. Ver para crer. Pode ser que tal sirva para atenuar um pouco a raiva sentida pela forma como as gentes de Fozcoa foram vigarizadas. Não sei, duvido. De qualquer modo, havemos de ir a Fozcoa.

Post scriptum

Verdadeiramente intrigante é o que se pode ler sobre as gravuras no site do Parque Arqueológico :

Estes núcleos apresentam gravuras datadas, na sua maioria, do Paleolítico superior (mais de 10.000 antes do presente) mas o vale guardou também exemplos de pinturas e gravuras do Neolítico e Calcolítico, gravuras da Idade do Ferro e dos séculos XVII, XVIII, XIX e XX, altura em que os moleiros, os últimos gravadores do Côa, abandonaram o fundo do vale.Diferentes homens e mulheres deixaram a sua marca nas rochas, desde há cerca de 25.000 até à contemporaneidade.

Assim como neste texto do mesmo site:

“ A tradição de gravura neste sítio [ Canada do Inferno] continuou durante o Neolítico e só terminou nos anos 50 do século XX com as gravuras picotadas pelos últimos moleiros do Côa. Entre eles, salienta-se António Seixas, cujas gravuras se encontram na sua maioria submersas.

Terá de se conceder que são dois trechos muito intrigantes e perturbadores. Dá para ficar a pensar e a matutar na coisa...

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