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sexta-feira, junho 18, 2010

A SAIDA DE PORTUGAL DO EURO

Como é que um país da Eurolândia abandona ou abandonaria a moeda Euro ?
Como seria e que sucederia se Portugal tiver ou tivesse de o fazer? Não tenho bem ideia, nem sei muito bem se alguem terá . Era um bom exercício de simulação e ficção, a que talvez fosse bom e prudente dedicar-se uma equipa de experientes e competentes economistas.

Em todo o caso, irei, por minha conta e risco, fazer um exercício de ficção económica e política, ciente embora de quão limitados são os meus conhecimentos para fazer um exercício desses, de ficção politico-económica, mais ou menos delirante e com um mínimo de fiabilidade. Trata-se, obviamente, de um mero exercício de ficção, construida sobre um hipotético cenário de tal acontecimento. Vale o que vale, como agora se diz, ou seja, valerá pouco. Tome-se mais como uma brincadeira.

A situação económico-financeira portuguesa não cessava de se agravar. O endividamento externo do País atingia valores enormes, o Governo não conseguia fazer baixar a dívida do Estado ao exterior, e os défices públicos estavam muito distantes dos tectos fixados pelos restantes países da Eurolândia.

Desde há umas semanas que circulavam, por entre as instituições financeiras internacionais, em particular o Banco Central Europeu (BCE), o FMI e a OCDE, muitos rumores de que seria bastante provável que Portugal tivesse de abandonar o Euro. Internamente, essa iminente possibilidade era conhecida e reconhecida apenas pelo PM, pelo Ministro das Finanças, pelo Governador do Banco de Portugal, e por mais um reduzido número de pessoas, que haviam feito entre si um rigoroso pacto de silêncio.
Entrevistado por um jornalista alemão, o Presidente do BCE é interrogado sobre se se confirmam os rumores que circulam de que Portugal vai ter de abandonar o Euro. O Presidente do BCE mostra-se surpreendido e indignado com tais rumores, e nega categoricamente que tal coisa esteja prevista e vá suceder. Por sua vez, o Bloco de Esquerda interpela na Assembleia da República o Governo sobre os mesmos rumores. O deputado João Oliveira, do PCP, no seu habitual registo de voz sôfrega e estridente, denuncia as cedências do Governo perante o grande capital financeiro especulativo, ao serviço do capitalismo e dos monopólios.
A deputada Rita Rato, do PCP, torna a vociferar que “ a saída da crise não passa por claudicar perante os interesses do grande capital e das grandes potências europeias!. Impõe-se uma política de afirmação e recuperação da nossa soberania ; de valorização dos salários; de promoção e defesa da produção nacional; de aposta no investimento público; de criação de emprego e combate ao desemprego... “.

O Ministro das Finanças nega categórica e veementemente, declarando que tais rumores mais não são do que manobras dos especuladores internacionais. À noite, no telejornal das 20 horas da RTP, reitera o mesmo formal desmentido, de forma igualmente categórica e veemente.

Dois dias depois, numa sexta feira, pelas 16 horas, tem lugar em Bruxelas uma reunião, convocada na manhã do mesmo dia, dos ministros das finanças dos paises do euro com o governador e vices-governadores do BCE, chegados há umas horas de Frankfurt.
O Ministro das Finanças português informa que Portugal não tem condições de tesouraria para poder cumprir os compromissos de pagamento da sua dívida soberana, que se vencem dali a duas semanas. Os outros países do Euro asseguram a Portugal uma ajuda de emergência, mas para tal colocam como condição que Portugal abandone a zona Euro.
É como se fosse um ultimato, nada mais há a fazer. Se não aceitar, a ajuda de emergência não é concedida , Portugal entrará na bancarrota. Não haverá quem venda mais a Portugal, seja petroleo, seja trigo, seja alimentos. Colocado contra a parede, o Ministro das Finanças não tem alternativa. Ainda esboça um tímido mas... mas todos os outros presentes reagem com um “não há mas nem meio mas..” . É pegar ou largar.

O ministro das Finanças português telefona logo ao Primeiro-Ministro e sugere-lhe que faça uma comunicação ao País, às 21 horas. Assim acontece, de facto.
Com ar solene, rosto perturbado, gravata azul turquesa, o Primeiro-Ministro dá a notícia . Balbucia uma explicação de que não havia outra alternativa. O mundo mudara completamente nos últimos 8 dias, e os nossos parceiros da Eurolândia apontaram-nos a faca ao peito. Informa que a nova moeda portuguesa se torna a chamar escudo, o antigo PTE. Mais informa que os bancos estarão fechados até à 4ª feira seguinte.

Saído dos estúdios da televisão, convoca para uma reunião o Governador do Banco de Portugal, entretanto regressado de Bruxelas no Falcon da Força Aérea. Ordena-lhe que convoque uma reunião urgentíssima dos Presidentes dos Conselhos de Administração de todos os bancos operando em Portugal . A qual tem lugar às 24 horas.

Depois de ouvir o Primeiro-Ministro na televisão, os portugueses saem de imediato em massa às ruas. Correm a levantar notas de euros das caixa Multibanco. Cada um procura sacar o mais possível de notas de Euro. Os mais remediados, levantam logo 200 Euros. Os mais endinheirados, tendo na família 3 e 4 cartões MB e/ou de crédito, conseguem levantar 1000 a 2000 euros. Em menos de 2 horas, as caixas MB ficam vazias de notas de Euro.
Nas lojas dos centros comerciais, nos restaurante e nas bombas de gasolina, não são aceites quaisquer pagamentos com cartões MB ou de crédito. Só aceitam pagamentos em notas de Euro, as quais obviamente serão depois guardadas em caixas, numa primeira fase, e depois em cofres e dentro dos colchões.

O Governo nomeia nessa noite comissários políticos e inspectores para todos os bancos. Estes recebem instruções rigorosas para, até 3ª feira às 24:00 horas, transformarem toda a sua moeda escritural, ou melor, todos os seus débitos e créditos internos, de euros em escudos (PTE). A razão de transformação será de um escudo por cada Euro.

O PCP aplaude e rejubila. Convoca logo uma conferência de imprensa e uma manifestação. Portugal fica finalmente libertado da vergonhosa tutela e do controlo dos grandes grupos económicos, da influência do capitalismo monopolista e da alta finança internacional. Através da sua voz vibrante, o deputado Bernardino Soares, recorda que sempre, desde o primeiro dia, o pê-cê-pê havia sido vigorosamente contra a perda de soberania nacional que representara a adesão de Portugal primeiro à CEE, depois à União Europeia e ao tratado de Lisboa.

Durante o fim de semana, e até 3ª feira à noite, na Casa da Moeda, em Lisboa, trabalha-se intensa e continuamente na impressão de uma tarja vermelha, na diagonal, no maior número de notas de 5, 10, 50 e 100 euros que for possível . Essas notas passarão a ser temporariamente designadas por notas de 5, 10, 50 e 100 escudos, respectivamente. Entretanto, são encomendadas com carácter muito urgente, novas chapas e muito papel para a futura impressão de notas de 10, 50, 100, 500, 1000, 5000 e 10000 escudos. As notas antigas de Euros, com tarja vermelha são depois imediatamente distribuidas aos bancos para poderem ser colocadas de novo nas caixas MB , para as famílias se abastecerem da nova moeda.
Alguns advogados de cidadãos mais empertigados, logo colocam junto de alguns tribunais providências cautelares requerendo a suspensão da transformção de Euros em Escudos, com o argumento de que os depósitos nos bancos haviam sido feitos em Euros, e era anticonstitucional uma das partes ou seja os bancos, transformarem esse depósitos em escudos. Muitos juizes logo decidem dar provimento às ditas providências cautelares. Claro que há recursos, para serem julgados dali a 3 anos, pelo menos.

Pouco a pouco, a partir de 4ª feira, vão recomeçando as transacções do dia a dia, intermediadas pela moeda, desta feita o Escudo . Aparentemente a vida vai-se normalizando um pouco, depois dos tempos agitados e de braza dos últimos dias. As máquinas e os dispositivos que trabalham com moedas, seja para venderem Coca-Cola e água mineral, seja para se pagar o estacionamento, ainda vão funcionando com as moedas de Euro . Mas cada vez menos, pois as pessoas vão guardando tudo o que for Euro, mesmo em moedas.

O empréstimo de emergência dos restantes países do Euro ( essencialmente da Alemanha, claro está...) é concedido, e o Estado português lá pode satisfazer os seus compromissos financeiros, evitando a bancarrota à última hora.

Nada de muito espectacular sucede nas 2 semanas seguintes. Os centros comerciais, as lojas da FNAC e da Worten, os concertos rock, a ponte 25 de Abril, o Algarve, a Costa da Caparica, os espectáculos no CAE, o FozPlaza, as festas populares, continuam cheios de gente despreocupada e mais ou menos feliz.

Até que na 4ª feira da segunda semana, começam a surgir rumores sobre uma desvalorização do Escudo. Novamente o BE , o PCP, o CDS e, já me esquecia, a espevitada deputada Heloisa Apolónia, de “Os Verdes”, interpelam o Governo no Parlamento sobre a verdade desses rumores. O Primeiro-Ministro e o Ministro das Finanças negam peremptória e veementemente a veracidade de tais especulativos boatos. Na 5ª feira, o Ministro das Finanças é entrevistado na RTP 1 por António Perez Metelo, e nega terminantemente que o Escudo vá ser desvalorizado. Na 6ª feira à tarde, entrevistado de novo à saida de uma reunião do Conselho de Ministros, torna a fazer igual desmentido, de forma categórica.

No sábado de manhã, todos os noticiários da rádio, da televisão e todas as páginas da internet anunciam que o Governo português deliberou desvalorizar o Escudo em 15 % relativamente ao Euro.

Nova corrida dos portugueses às bombas de gasolina e aos supermercados. No final do dia de sábado, já as bombas estão esgotadas de gasolina e as prateleiras dos supermercados meio vazias de produtos alimentares.
Na 2ª feira, as gasolineiras começam a ser re-abastecidas. Mas entretanto, os preços dos combustíveis são logo aumentados em 15% . O mesmo vai começando gradualmente a acontecer com os bens alimentares.

Decorrido um mês, o INE publica o primeiro boletim de estatísticas económicas depois da saida do Euro. Relativamente ao mês homólogo do ano anterior, a inflacção situa-se agora em 13%. Os economistas anunciam que no mês seguinte será quase de certeza revista em forte alta.

E pronto. É assim que, ficando tudo o que é importado 15% mais caro, num ápice, da noite para o dia, são diminuidas em cerca de 12 a 13% as remunerações e as pensões de todos os portugueses. Ricos, assim-assim, remediados, e pobres.

Esteja descansado o leitor. Não se assuste. Nem corra já para uma caixa MultiBanco ou para uma bomba de gasolina. Tudo o que leu ( se teve paciência para ler..) é somente ficção. Assim em imitação pechisbeque e a muito mal amanhado jeito da brincadeira radiofónica ficionada por Orson Wells no final dos anos 30, a qual provocou o pânico nos ouvintes, que pensaram estar em curso uma invasão de extra terrestres.
Só que, sendo a saída de Portugal do Euro considerada, por agora, ainda pouco provável, tal cenário tem todavia muito maior probabilidade de ocorrer do que uma invasão de extra terrestres....

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