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quarta-feira, abril 07, 2010


O DESCREDITO PREDIAL

Acabo de ler uma obra que recomendo vivamente a quem se interessar pelo tema. Trata-se do livro “ Vem aí a República”, do prof. Romero de Magalhães, numa edição da Almedina. Nele faz uma escelente descrição histórica do período final da Monarquia, entre 1906 e a amotinação civil-militar, em Lisboa, que culminou na fuga do Rei D. Manuel II e na proclamação da República.
Ao novo regime político aderiu ( ou “adesivou-se” ...) depois o resto do País, mediante comunicação telegráfica. Coisa semelhante ocorreu , seis décadas mais tarde, quando a vitória do golpe militar de 25 de Abril se estendeu ao restante País, mas desta feita pela televisão.

Recordo-me de ter lido, um par de anos depois, salvo erro num escrito de Manuel de Lucena, e fazendo uma primeira interpretação histórica do que sucedera no 25 de Abril, que “não se derruba o que é mau, derruba-se o que é fraco”.
Muito enfraquecida estava de facto a Monarquia portuguesa, há 100 anos, como é narrado na citada obra. E o que é muito perturbador, é verificar que muito do contexto politico-social, dos casos, das situações que então se viviam, encontram alguns paralelos nos tempos que hoje vivemos. As aparentes semelhanças talvez sejam só coincidências . Tenho sincera esperança que mais não sejam que coincidências .

Depois do regicídio de Fevereiro de 1908 e até ao 5 de Outubro de 1910 , houve 6 governos, no chamado esquema do rotativismo. Em finais de 1909, havia 7 partidos monárquicos. Mesmo entre os dirigentes políticos monárquicos, trocavam-se insultos, acusações, facadas nas costas. Sucediam-se os escandalos políticos e financeiros . Os políticos republicanos, compreensivelmente, ajudavam à festa. A questão dos “adiantamentos à casa real”, e o caso do monopólio dos tabacos vinham e permaneciam do antecedente .
Em Abril de 1910, rebentava o escândalo da questão Hinton, sobre o negócio da atribuição do monopólio do açúcar e do alcool na Madeira e no qual apareceu envolvido um membro importante da casa militar do rei, comandante do iate real Amelia.
Logo depois, em Maio, estalava novo escândalo com o Crédito Predial, revelando uma gestão ruinosa e fraudulenta na qual apareciam envolvidos os chefes dos principais partidos monárquicos, os tais do “rotativismo”, tal como José Luciano de Castro e Hintze Ribeiro. Na administração do Credito Predial figuravam ex-ministros, deputados, pares do Reino, representantes das casa do rei, procurador régio.

(...)
Tinha sido descoberto que a Administração do Crédito, para conseguir distribuir dividendos, apresentava as suas contas viciadas. Faltava escriturar operações realizadas, havia-as sobrevalorizadas, os balanços estavam mal elaborados. A falsificação da escrita tinha permitido apresentar lucros fictícios. Havia mesmo desfalques de caixa. E constatava-se ainda a emissão ilegal de obrigações e irregularidades na administração de propriedades.
Claro que foi um contabilista culpado. Depois o tesoureiro. Com razão, porque aproveitando a escrituração irregular se tinham locupletado. Mas o novo vice-hovernador, João Albino de Sousa Rodrigues, quer acertar as contas, e quer apurar responsabilidades. O que logo põe em causa a velha raposa progressista. São nomeados peritos que de imediato concluem que “ as falsificações e viciações da escrita datavam de muito longe, sendo diversíssimos os processos que, para isso, foram usados e empregados
(...)
Os obrigacionistas pediram ao Paralamento que interviesse. O governo progressista de Veiga Beirão caía, que a proximidade de José Luciano lhe dificultava a vida. Aliás, o próprio ministro da Justiça fazia parte dos corpos gerentes do Crédito Predial.
(...)
Os jornais republicanos divertiam-se : “ Talvez o sr. D. Manuel ainda conseguisse resolver a crise sem grandes dificuldades, organizando-se um ministério de concentração predial”.
(in obra citada)


Ainda não havia off-shores, nem complicados e confusos produtos financeiros como agora há. Nem remunerações milionários para os administradores super competentes.
O jornal republicano “ A Pátria” fazia trocadilho em título da sua primeira página : “O Descrédito Predial”. O governo de Veiga Beirão caiu. Sucedeu-lhe, ainda em Maio, o de Teixeira de Sousa. Durou 4 meses. Seria o último da Monarquia. Ainda promoveu novas eleições, em Agosto de 1910, que venceria. Proclamada a República, Teixeira de Sousa “adesivou-se” ao novo regime republicano.

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