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terça-feira, abril 27, 2010

A LÓGICA DA GREVE

Numa perspectiva marxiana da luta de classes, a greve, enquanto arma a usar nessa luta, tem mais ou menos a seguinte lógica. Na produção de bens ou serviços (mercadorias, no jargão marxiano), o patrão apropria-se de uma “mais valia”, que corresponde à diferença entre o preço pelo qual ele vende o resultado do trabalho e o preço pelo qual ele compra a força do trabalho. Ora, se os trabalhadores ( a classe operária, no jargão marxiano) fizerem greve, o patrão deixa de se apropriar dessa mais valia, da qual vive e cresce o seu poder.
Logo, desprovido desse meio de subsistência, será forçado a prescindir de parte dessa mais valia, preferirá ceder às reivindicações dos trabalhadores, e estes poderão assim ver melhorados os seus salários.
Nos tempos que correm, e pelo que por aí vemos, em particular no domínio dos serviços básicos, a lógica da greve parece ser outra : pretende-se é causar o maior incómodo possível ao maior número possível de utentes. Importa pouco se os mais atingidos são os mais frágeis, pois os patrões, os capitalistas, os burgueses, têm meios de mais ou menos escaparem a tais incómodos.
Os utentes, pobres, remediados, ou ricos, são também eleitores. E através do poder do seu putativo voto, terão tendência a pressionar os responsáveis pelo governo da República, prestadora daqueles serviços. É possível e é de prever que esse governo acabe por ceder, face ao clamor da opinião pública. Quando tiver margem para ceder, cede ; quando não tiver, não cede, por simplesmente não poder.

Esta lógica, assim pensada e pintada com cores de grande cinismo, é verdadeira, até um certo ponto crítico. A partir deste, os utentes-eleitores-consumidores-cidadãos desesperam e apercebem-se que o Estado não pode ceder, sob pena da situação económica e financeira do Estado se degradar cada vez mais. Podem então virar a sua cólera, contra os grevistas (sobretudo contra os das profissões mais favorecidas, como os pilotos da TAP ou os maquinistas da CP), contra os sindicatos agitadores e contra os partidos políticos que, meio escondidos, e fingindo não ser nada com eles, fomentam essa agitação e tais suicidários comportamentos. O feitiço vira-se em geral contra o feiticeiro. No mínimo, aquela cólera, poderá ter mera expressão eleitoral, em democracia. No máximo, poderá ter consequências mais sérias para a própria democracia.
Sabendo ler a história,que está recheada de exemplos, deveria saber-se disto . Custa-me a crer que haja quem, com cultura e lucidez, ainda o não saiba.

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