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quarta-feira, janeiro 13, 2010

O DESEQUILÍBRIO FINANCEIRO NO MUNICÍPIO DA FIGUEIRA DA FOZ É CONJUNTURAL OU ESTRUTURAL ? - 3

Do endividamento autárquico trata o Título IV da Lei das Finanças Locais (Lei 02/2007). São nele previstos dois tipos de situações :

A) situação de desequilíbrio financeiro conjuntural ;
B) situação de desequilíbrio financeiro estrutural

Da primeira, cura o artigo 40º , com o título de “saneamento financeiro conjuntural”.
Da segunda, cura o artigo 41º , com o título de “reequilíbrio financeiro estrutural”
A)
O desequilíbrio conjuntural não está muito caracterizado no plano quantitativo. O artº 40º determina que os municípios que estejam nesta situação

“devem contrarir empréstimo para saneamento financeiro, tendo em vista a reprogramação da dívida e a consolidação da dívida e a consolidação dos passivos financeiros, desde que o resultado da operação não aumente o endividamento líquido dos municípios”.

Para este efeito, “endividamento líquido” é a diferença entre a soma dos passivos (empréstimos de bancos, contratos de locação financeira e dívidas a fornecedores) e a soma dos activos (saldo de caixa, depósitos em instituições financeiras e créditos sobre terceiros).
No caso do Município da Figueira da Foz, e considerando estas definições, a soma dos activos não deverá exceder muito uns 3 a 4 milhões de Euros (ME) . A soma dos passivos, segundo informou o Presidente da câmara, andará pelo menos pelos 60 ME. Ou seja, os empréstimos para o dito saneamento financeiro não poderão/deverão, em estimativa aproximada, exceder os tais 3 a 4 ME. E como nesse mesmo artigo 40º estipula que o empréstimo deve ter em vista “ a reprogramação da dívida e a consolidação de passivos financeiros” , o seu efeito será fundamentalmente aliviar um pouco o esforço da dívida ( em juros e amortizações dos empréstimos) e pagar dívidas a fornecedores.
Com o que os recursos adicionais que ficam disponíveis para efectivo reforço do quadro orçamental, se limitarão a uns 2 a 3 ME. Pouco mais que trocos, face às actuais necessidades de injecção de receitas de capital, para fazer face aos custosos compromissos assumidos
O artigo 40º fixa depois um conjunto de requisitos e condicionantes, tais como um estudo fundamentado sobre a situação financeira e um plano de saneamento, submetidos pela Câmara à Assembleia Municipal (AM), e a elaboração de relatórios semestrais sobre a execução do plano, a submeter igualmente à AM.
B)
O artigo 41º começa por definir a sua aplicação a municípios em situação de “desequilíbrio estrutural ou de ruptura financeira”. Estes deverão ser “sujeitos a um plano de reestruturação financeira”.
Em primeira linha, cabe à AM declarar o Município em situação de “desequilíbrio financeiro estrutural ou de ruptura financeira” , sob proposta da CM.
Só que, nos termos do ponto 3 do mesmo artigo, tal situação pode também declarada, subsidiariamente, (esclarece o mesmo artigo - Nota 1) por despacho conjunto dos ministros das Finanças e da Administração Interna, quando existirem “dívidas a fornecedores de montante superior a 50% das receitas totais do ano anterior”.

Ora, a dívida total do Município no início de 2010 será à roda de 60 ME. O capital em dívida a instituições financeiras (empréstimos a médio e longo prazo),no final de 2009, é de 29 ME . A diferença, 31 ME, será de dívidas a fornecedores. Não sei ( o executivo municipal já o saberá...) qual foi o total de receitas em 2009. Em 2008 foi de 35,4 ME . Admitamos, com generoso optimismo, que tenha sido em 2009 de 40 ME . Metade deste valor é 20 ME, valor bem inferior a 31 ME , valor da dívida a fornecedores. O Município da Figueira afigura-se-me estar assim nas condições indicadas no dito ponto 3.

Em tal caso, a Lei determina que o Município deverá submeter ao Ministro das Finaças um plano detalhado de “re-estruturação financeira” (e não já de mero “saneamento financeiro”). O qual, se aprovado, possibilitará que o Município celebre um “contrato de re-equilíbrio financeiro” com uma instituição de crédito, a prazo inferior a 20 anos. Todavia, na vigência de tal contrato, o Município ficará sob a rigorosa e embaraçante tutela administrativa e financeira do Ministro da Administração Interna, ao qual, por exemplo, deverá ser previa e trimestralmente comunicado :
- a contratação de pessoal
- a aquisição de bens e serviços ou adjudicação de empreitadas de valor superior ao legalmente exigido para realização de concurso público

Estaríamos , ou estaremos, então, perante uma situação de excepção, que estará ao arrepio e sem obediência ao princípio da autonomia do poder local autárquico, acolhido na Constitução da República . O que representará um estatuto de uma certa menoridade cívica, cumpre e lamento reconhecê-lo.
Não sei se tal situação já terá ocorrido na vida do poder autárquico nacional . Mas alguma vez teria , ou terá, de acontecer.

Nota 1
Da leitura da Lei, fica-me porém uma dúvida, quanto à interpretação a dar ao advérbio “subsidiariamente” . Quererá ele dizer que, se a AM não tomar a iniciativa de declarar o Municipio em situação “de desequilíbrio financeiro estrutural ou de ruptura financeira” , o Ministro das Finanças o poderá fazer, desde que verificada a condição da “existência de dívidas a fornecedores de montante superior a 50% das receitas totais do ano anterior”? Esta parece-me ser a interpretação correcta, pois tal mecanismo de intervenção corresponderá a um indispensável e derradeiro fusível , colocado à disposição do Governo central, para prevenir cenários de verdadeira e completa ruptura não só financeira, como social, de um Município caído na incapacidade de poder cumprir a sua missão de “prossecução de interesses próprios da população respectiva”, que tem consagração constitucional .

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