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quarta-feira, agosto 05, 2009

OS JUIZES NOS TURBILHÕES DAS LUTAS POLITICO-PARTIDÁRIAS

Na carta aberta que João Ataíde, candidato do PS a Presidente da Câmara , remeteu a eleitores da Figueira da Foz , pode ler-se uma afirmação que merece um comentário. É quando assim escreve : “Acumulei experiência e um conhecimento real da vida e das suas dificuldades ao longo destes muitos anos de profissão”.
Se entendo bem, considerar ser juiz uma “profissão” , assim sem mais, fere o espírito constitucional e os principios de um estado de direito europeu.
Nos termos constitucionais, “os tribunais são os orgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo” . Os titulares desses orgãos de soberania, são os juizes. A organização dos tribunais está fixada no Título V da Parte III da Constituição. Em nenhum lugar desta Parte III se alude a profissões, mas tão só à organização do poder político, ou seja, aos orgãos de soberania. Cujos titulares o são enquanto tal, e não no exercício de uma “profissão” . Não é “profissão” ser deputado, ministro, ou membro de uma Câmara Municipal. Se às vezes estes exercícios são percebidos como tal pela opinião pública, tal deve-se a perversões da vida política.
Caso "juiz" fosse profissão, seriam então os únicos profissionais a gozar de independência para não estarem “sujeitos a ordens ou instruções”, por deverem julgar “apenas segundo a Constituição e a lei” . Seriam os únicos a ter o privilégio de gozarem “de foro próprio “, “ para o inquérito, a instrução e o julgamento dos magistrados judiciais por infracção penal” .
Por outro lado, e ao contrário dos outros titulares de orgãos de soberania, não são eleitos, nem “podem ser responsabilizados pelas suas decisões” .

Até poderei admitir (ou vir a admitir) que o candidato proposto pelo PS tenha caracteristicas pessoais, politicas e de comportamento cívico que possam fazer dele um bom e eficiente Presidente da Câmara. Ou que possa ser boa a equipa que congregou ou vai constituir para trabalhar com ele nos orgãos municipais. Depois se verá.
Alguns talvez tenham começado por alimentar a esperança que a sua candidatura pudesse ter o préstimo de contribuir para ser feita uma certa limpeza nos jogos do caciquismo partidário local . Quiça reconheçam agora terem feito um erro de avaliação.
Mas para mim não é nada disso que está em causa. Do que se trata é que ela, acima de tudo, tem em si mesma esse pecado original : é uma candidatura de um titular de um orgão de soberania do poder judicial . O qual assim se vai envolver ou ver envolvido nos turbilhões dos pleitos politico-partidários. Estar com “licença sem vencimento de longa duração” relativamente a essa missão de soberania ( que nao “profissão”...) não altera nem um miligrama de peso àquele pecado original. A mistura mais ou menos promíscua entre os agentes da administração da Justiça e os actores da politica partidária, é um perigoso entorse aos princípios de um Estado de direito democrático. A continuar a ter lugar ou a acentuar-se, vai dar mau resultado, cedo ou tarde.

Pela minha parte, e passe a presunção, procuro manter obediência a princípios. É esta obediência que me leva a, radicalmente, discordar de uma candidatura de um juiz a uma Câmara Municipal. Nem a esta, à da minha terra (e desde que a candidatura foi anunciada), nem a qualquer outra . Não lhe dando, por isso, nem a hipótese do meu apoio, nem do meu voto.

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