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domingo, agosto 09, 2009

O SANEAMENTO FINANCEIRO DA CÂMARA DA FIGUEIRA

Parto do princípio de que os três principais candidatos à Câmara Municipal da Figueira da Foz (CMFF) se estejam a referir ao mesmo, quando referem ser sua (primeira?...) prioridade proceder ao saneamento da situação financeira. Entendendo como tal :

- a obtenção, a curto prazo, do equilíbrio entre as receitas recolhidas e as despesas que aquelas receitas permitem efectivamente fazer . Este “fazer” refere-se ao somatório dos valores de todas as facturas do ano civil ; não ao somatório de todos os pagamentos efectivamente liquidados .
- a redução gradual do passivo a curto prazo, a fornecedores, visando tornar prática habitual o pagamento das suas facturas, a 60 dias, como é próprio de pessoas de bem.

Assim definido o dito saneamento, será obrigação dos candidatos explicarem, com mais detalhe, se, quando e como o vão realizar.

Para tal, importa partir de um cenário/quadro financeiro e orçamental que, em linhas gerais, não deverá estar muito longe deste esboçado nos pontos seguintes .

1. Tendo em conta que a crise mundial ainda está para durar mais uns tempos, o melhor cenário que se poderá esperar para os próximos anos de 2010 e 2011 será um idêntico ao da execução orçamental de 2008. Partamos então deste.

2. A capacidade do Municipio da Figueira da Foz (MFF) para recolher receitas, num ano, deve andar à roda do seguinte (em milhões de euros, ME) :

-Receitas correntes : 29,5 ME
-Receitas de capital : 6,0 ME
-Total : 35,5 ME

(Nota 1)

3. Dos 6,0 ME de receitas de capital, 1,8 ME foram conseguidos por via de um empréstimo bancário.Por isso, a capacidade anual “padrão” de recolher receitas será de 35,5 - 1,8 = 33,7 ME .O nível actual da despesa anual com pessoal anda pelos 11 ME (Nota 2). Esta é uma despesa com grande rigidez (despesa corrente primária). Assim como o serão as despesas com amortizações de emprestimos bancários ( 4,0 ME ) e de juros ( 2,1 ME) . Deduzidas estas, ficará para outras despesas: 33,7 - 11,0 - 4,0 - 2,1 = 16,6 ME .

4. Desta verba, haverá que destacar cerca de 6,5 ME para garantir, pagando, um nível de investimento da mesma ordem de grandeza do verificado em 2008 (Nota 3) . Que foi escasso, sublinhe-se. Restarão 10,1 ME.

5. Cerca de 7,4 ME serão necessários para pagar a aquisição de bens e serviços (iluminação pública, recolha e tratamento de RSU’s, transportes escolares...), ao nível do mesmo ano de 2008. Sobram então 2,7 ME .

6. Para impostos e taxas, terão de ser afectos cerca de 0,4 ME, e para transferencias correntes para as Juntas de Freguesia, cerca de 0,8 ME . Restam portanto 1,3 ME .

7. Deste montante, terão de sair os habituais subsídios para colectividades e para as empresas públicas. Ora só a empresa municipal Figueira Grande Turismo (FGT) “ comeu” em 2008 pelo menos 0,95 ME de recursos financeiros do MFF , para festas e na chamada “animação turística” ( 0,65 ME ), e para pagamento directo dos custos de espectáculos no CAE (0,30 ME) (Nota 4).

8. Mantendo as diversas despesas referidas aos níveis do exercício de 2008, muito pouca ou nenhuma margem fica para se poder reduzir gradualmente valor da dívida total a fornecedores .

9. A dívida a fornecedores, no final de 2008, era de 35,6 ME . Actualmente, e depois da CMFF ter pago aos fornecedores 11,8 ME disponibilizados pelo Governo , a título de novo empréstimo (programa PREDE) , a dívida terá caido, presumo, para cerca de 23,8 ME . Isto no caso de não ter havido nova contracção de calotes, aproveitando a folga e o facto de vivermos tempos eleitoralistas... .

10. O volume de despesa anual que se traduz em facturas que têm de ser pagas é da ordem dos 16,6 ME acima aludidos(ver ponto 3) ; corresponde a um “fluxo de caixa” de cerca de 1,4 ME por mês. Se o objectivo for realmente de passar a pagar as facturas a 60 dias, isso equivaleria a manter um “stock” de dívida corrente a fornecedores à roda de 2,8 a 3,0 ME .

11. No final de 1997, a dívida a fornecedores era de 3,6 ME . Este poderia ser um objectivo. Mas sejamos menos ambiciosos. Fixemos como objectivo reduzir agora a dívida para um nível de 7,0 ME . Partindo do possível nível actual de 23,8 ME, haverá 16,8 ME ( 23,8 - 7 = 16,8) de dívida a reduzir . Gradualmente, pelo menos.

12. Se a CMFF reduzir 2,0 ME por ano, levará mais de 8 anos a reduzir a dívida a fornecedores para o tal nível de 7,0 ME, e logo a ter completado o tal saneamento financeiro. Isto, no pressuposto de que não haverá nova dívida a fornecedores a acumular-se pela circunstância das novas facturas não serem pagas no prazo devido.

13. Caso se pretenda fazer o saneamento em 4 anos ( o tempo de um mandato), então a redução anual terá de ser de 4,0 ME . Como caberá este montante no balanço anual acima ilustrado em linhas gerais , em que já para o seu final ( ponto 6) só sobram 1,3 ME ?

Sublinhe-se que o cenário traçado é feito com relativo optimismo. Tudo leva a crer que a recessão e a crise económica se vão manter , se não mesmo agravar internamente, com reflexo num abaixamento do nível das receitas recolhidas.

Limitado o tecto-montante global da receita, e com este quadro geral da possivel execução orçamental , ou com outro que entendam traçar como hipótese de trabalho, os candidatos têm a obrigação de prestar esclarecimentos, dar “linhas-guia” e pistas sobre a estratégia que vão seguir, sobre o onde e quanto vão cortar. E como vão tentar “meter o Rossio na Betesga”...Ou seja, o Rossio das necessidades e das despesas, na Betesga das receitas e dos recursos disponíveis. Alguma coisa terá de ficar de fora, e importava saber o quê, na opinião de cada candidato. Assim como importa saber com que recursos sobrantes vão fazer as muitas e lindas coisas que anunciam ou vão anunciar como “propostas”...
São estas perguntas a que eles têm de responder.

Nota 1
O orçamento da CMFF para 2009 estima ter 75,3 ME como receita total. Trata-se porém de pura fantasia, resultante de crónica propensão para o ficcionismo.

Nota 2
O Orçamento da CMFF para 2009 prevê todavia uma despesa com pessoal de quase 12,0 ME

Nota 3
Inclui igualmente despesas em obras de reparação , beneficiação e manutenção de infraestruturas (escolas, arruamentos, pavimentações,..) .

Nota 4
O balanço ilustrado não entra em linha de conta com as dívidas a fornecedores contraidas directamente pela FGT. Nem aqueles 0,95 ME correspondem realmente ao que custa a FGT e o CAE . Na conta de “demonstração de resultados” do exercício de 2008 da FGT , figura como proveito uma verba de quase 1,8 ME na rubrica de “ subsídios à exploração” . Não custa a adivinhar de onde vêm esses subsídios.

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