terça-feira, março 31, 2009
A INVERSÃO DO ÓNUS DA PROVA
“(...)
Apesar de serem conhecidas as casas que compra, os automóveis em que se desloca, os charutos que fuma, as férias que faz, tudo sinais de uma riqueza incompatível com o que se ganha, isso não autoriza ninguem em Portugal a investigar de onde vem aquele dinheiro e se o ganhou de forma lícita. “Sinais exteriores de riqueza” podem servir para o fisco actuar. Contudo, o “enriquecimento ilícito”, uma das formas jurídicas mais eficazes noutros países para combater a corrupção, não está previsto na lei portuguesa. O inimitável Augusto Santos Silva explicou este fim de semana que isso seria intolerável, porque representaria a “inversão do ónus da prova”, um pormenor que não preocupa os serviços fiscais mas incomoda todos os políticos que, na Assembleia, votaram contra a proposta do socialista João Cravinho que introduzia na lei portuguesa essa figura jurídica”
(in editorial do PUBLICO de ontem)
Aquele argumento de não ser tolerável a chamada “inversão do ónus da prova” é uma desculpa totalmente esfarrapada. A invocação deslocada de tal princípio, em sede parlamentar, pode justificar a criação de legítimas suspeitas quanto às suas verdadeiras razões. Como de facto cria. E conduz a situações verdadeiramente absurdas. Imaginemos uma.
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Apesar de serem conhecidas as casas que compra, os automóveis em que se desloca, os charutos que fuma, as férias que faz, tudo sinais de uma riqueza incompatível com o que se ganha, isso não autoriza ninguem em Portugal a investigar de onde vem aquele dinheiro e se o ganhou de forma lícita. “Sinais exteriores de riqueza” podem servir para o fisco actuar. Contudo, o “enriquecimento ilícito”, uma das formas jurídicas mais eficazes noutros países para combater a corrupção, não está previsto na lei portuguesa. O inimitável Augusto Santos Silva explicou este fim de semana que isso seria intolerável, porque representaria a “inversão do ónus da prova”, um pormenor que não preocupa os serviços fiscais mas incomoda todos os políticos que, na Assembleia, votaram contra a proposta do socialista João Cravinho que introduzia na lei portuguesa essa figura jurídica”
(in editorial do PUBLICO de ontem)
Aquele argumento de não ser tolerável a chamada “inversão do ónus da prova” é uma desculpa totalmente esfarrapada. A invocação deslocada de tal princípio, em sede parlamentar, pode justificar a criação de legítimas suspeitas quanto às suas verdadeiras razões. Como de facto cria. E conduz a situações verdadeiramente absurdas. Imaginemos uma.
Um polícia, na sua ronda nocturna ( se isso é coisa que ainda se faz...) dá de caras na rua com um indívíduo, de aspecto muito suspeito, com um novíssimo televisor de plasma debaixo do braço. Manda-o parar e interpela-o para que justifique como e porquê leva assim o televisor. O suspeito indivíduo garante que o televisor é dele. O guarda intima-o para ir à esquadra a fim de se justificar e provar que o televisor é mesmo dele, e como o adquiriu. Como o hipotético gatuno não consegue explicar, vai a julgamento, como arguido de “alegadamente” ter roubado um televisor a alguém que se não queixou ainda. Identifica-se, diz estar desempregado há muito tempo, e estar a viver habitualmente na rua. Ouve então a acusação de ser suspeito de ter roubado um televisor. O juiz pergunta-lhe como é que, estando desempregado há tanto tempo e sem meios de subsistência, pode adquirir um novíssimo televisor. Aí, ao douto juiz, o hipotético gatuno levanta a voz e declara para quem o quer ouvir : “ Alto aí, senhor juiz!. O senhor está a inverter o “ónus da prova”. Quem tem de provar que o televisor é roubado, é a polícia e o digníssimo magistrado do ministério público” . E não é que, muito possivelmente, em obediência a esse sacrossanto princípio do “ónus da prova”, o senhor juiz daria como não provado o roubo ? Pois claro. Fazer de outra forma seria um grave atentado aos sagrados direitos das pessoas, consagrados na Constituição.
Lá teríamos o ministro Santos Silva a malhar nos senhores juizes, se eles não respeitassem esses direitos. Estão a ver a cena, não estão?