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quarta-feira, abril 25, 2007

O 25 DE ABRIL CELEBRADO HÁ 25 ANOS

Do fundo poeirento dos meus arquivos, recupero palavras escritas que proferi em 25 de Abril de 1982, em representação da Câmara Municipal, na sessão solene da Assembleia Municipal da Figueira da Foz realizada nesse dia.
Achei que valeria a pena relembrá-las, na íntegra, importando situá-las no contexto do debate ( já bastante azedado por alguns “progressistas” defensores das conquistas irreversíveis...) que então estava em curso sobre a primeira revisão constitucional, e da grave crise económica que se vivia, antecipando a criação de violentas medidas de contenção que o Fundo Monetário Internacional viria a impor a Portugal.
Entre jantares, manifestações, sessões solenes no Parlamento e em câmaras municipais, com este ritual sacralizado que ano após ano se repete, já se devem contar por vários milhares os discursos feitos por todo o país desde a implantação do regime democrático, . Confesso não ter imaginação para, nos dias de hoje, compor um texto celebratório inédito, e com conteúdo que ainda não haja sido dito e repetido tantas vezes.


Sr. Presidente da Assembleia Municipal
Srs. Veredores da Câmara Municipal
Srs. Deputados municipais
Autoridades civis e militares
Minhas senhoras e meus senhores

Faz hoje precisamente 8 anos que uma rebelião militar, promovida e comandada por oficiais subalternos das forças armadas portuguesas, sem substracto de estrutura ideológica consistente e bem clara, de causas e características iniciais acentuadamente corporativas e castrenses, derrubava, em poucas horas, a super estrutura política de um regime totalitário, antigo de quase meio século.
Com a imparável explosão popular que depois lhe deu inequívovo apoio, irrompendo em festa através do acenar de milhares de cravos vermelhos, dava-se início a um processo revolucionário que, marcado embora por aspectos e originalidades positivas e negativas, avanços e recuos, conquistas e desvios, esperanças e frustrações, a história decerto julgará como sendo das transformações mais profundas e significativas da caminhada da nação portuguesa no decorrer dos últimos 6 séculos..
Em 25 de Abril de 1975 – faz hoje também 7 anos – o povo português votava livremente pela primeira vez desde há 5 décadas.
E livremente se exprimia, optando por um modelo institucional de liberdade, de pluralismo partidário, e democracia entendida num sentido lato, e não limitada aos meros aspectos formais.
A Assembleia Constituinte eleita, mau grado os insultos recebidos, o cerca, as ameaças de dissolução, cumprindo o mandato popular recebido, acabaria por construir o texto constitucional com que, em 1976, o regime democrático se institucionalizava, e a democracia se começava a consolidar.
Não sem que antes fosse indispensável, em 25 de Novembro de 1975, travar com firmeza, mas com serenidade, as tentações e perversões dos patronos de novos e requentados totalitarismos, que entretanto o processo histórico deixara desenvolver.
Caberá recordar, como o senhor Presidente da República faz questão de frequentemente sublinhar, que o 25 de Novembro de 1975 complementa historicamente o 25 de Abril de 1974 e o 25 de Abril de 1975.
Reafirmou e recuperou a pureza do espírito e dos ideais do 25 de Abril de 1974 . Fez impor, com total legitimidade, a vontade popular livre e inequivocamente expressa em 25 de Abril de 1975. Tornou, ao fim e ao cabo, possível que a Constituição que hoje ordena a nossa vida colectiva, pudesse ser terminada e entrar em vigor.

Sr. Presidente
Minhas senhoras e meus senhores

Recordo-me de ter lido algures a afirmação de que não se derruba o que é mau, mas sim o que é fraco.
O regime totaliário corporativo – nascido e construido por inspiração bebida nos modelos socio-políticos do fascismo europeu das décadas de 30 e 40 – era obviamente mau, iníquo, injusto e condenável.
Em 25 de Abril de 1974, ele não foi porém derrubado por essas razões. Mas sim porque, roido pelas suas contradições internas, desacreditado interna e internacionalmente, desgastado no pântano de uma guerra colonial em futuro e sem justificação, apodrecido pela corrupção e pelo compadrio, desprovido de qualquer tipo de apoio popular, pertinazmente combatido pelas forças democráticas da resistência e por outras organizações partidárias conjunturalmente interessadas também no seu derrube, o regime não tinha já, nem folego, nem estímulos, nem engenho, para resistir ao sopro-abanão dado pelo Movimento Militar da madrugada de 25 de Abril de 1974.

Recordar hoje aquela data não pode ter um mero significado de celebração histórica mais ou menos jubilosa. Os acontecimentos estão ainda demasiado próximas de nós para permitirem a formação duma imagem histórica sem desfocagens.
Celebrar hoje o 25 de Abril deve adquirir, portanto, e em primeiro lugar, o significado de um agradecimento aos cidadãos militares que, podendo fazê-lo, tiveram a coragem de dar o abanão, e criar condições para o povo português ter dito e continuar a dizer, como quer viver e construir o futuro.
Celebrar hoje o 25 de Abril, é um acto de reafirmação das esperanças que os tempos sequentes ao golpe militar trouxeram a milhões de portugueses. É também um acto de fé nas virtualidades da democracia política que através do seu exercício pluralista, pacífico e institucionalizado, é condição básica para a gradual construção do verdadeiro conceito de democracia, vivida e fruida nos domínios do económico, do social e do cultural.

O 25 de Abril de 1974 é – e não deixará seguramente de o ser – uma data pertencente ao património histórico de todo o povo português.
O modelo de vida democrática configurado na Constituição que o 25 de Abril permitiu que o povo português elaborasse, é património social e político do nosso presente. Sê-lo-à também do nosso futuro.
Os ajustamentos, as actualizações e as rectificações que, por mandato popular, lhe vierem a ser introduzidas, no processo de revisão em curso, se enquadradas no cumprimento dos moldes de revisão acordados, e cumpridas as regras do exercício do poder popular representativo, decerto servirão para, prestando respeito aos ideais e ao espírito do 25 de Abril, ajudar a consolidar o regime democrático.

Não será contudo isso bastante.
Se o modelo político não conseguir provar na prática ser capaz de, com eficácia, com pragmatismo, com competência, com firmeza, com serenidade, mas também com rapidez, dar resposta concreta às aspirações e às necessidades concretas, bem poderão brilhantes tribunos fazer oratória parlamentar de louvor à Liberdade e à Democracia, clamando ser ela o mais lógico, o mais probo e o mais justo dos regimes.
Continuando por fazer a prova provada da sua eficácia e da sua capacidade social, económica e cultural, não se consolidadndo na vontade e na consciência de cada um de nós e na da grande maioria dos nossos concidadãos, o regime democrático correria então sérios riscos de enfraquecer.
E, como já recordei, faz-se tombar o que é fraco, não o que é mau

Sr. Presidente
Minhas senhoras e meus senhores

Poderão ser de maior ou menor escala a satisfação ou a decepção por aquilo que o regime democrático resultante do 25 de Abril de 1974 trouxe de concreto ou de subjectivo às esperanças que nele depositou cada um de nós.
O significado primitivo da data e das palavras, é o derrube do regime totalitário e a reconquista da Liberdade.
Mesmo ainda que só por isso, acredito com toda a sinceridade que a esmagadora maioria do povo português entende, cono eu entendo, ter valido a pena o 25 de Abril.

Não deixa porém de ser preocupante que, em torno duma efeméride com aquele significado, haja por vezes dificuldade em se estabelecer uma base comum de concordância.
Estou seguro de que tal não sucede, felizmente, a nível da vida colectiva do Município da Figueira da Foz . É um empenhado esforço nesse sentido que a Câmara Municipal faz, ao promover estas comemorações.
Entendo que presta um mau serviço ao regime democrático, aos ideais e ao espírito do 25 de Abril, quem, presunçosa e abusivamente, se arvora em escolta ideológica do 25 de Abril, ou em sentinela da Constituição.

O povo português, na pluralidade da sua vontade e das suas opções partidárias, foi e saberá ser as duas coisas.
É e continuará a ser esse o conteúdo da Constituiçao da República .
É esse o ideal, é esse o espírito que o povo português atribuiu ao movimento militar de 25 de Abril de 1974.
É portanto esse o espírito do 25 de Abril .

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