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quarta-feira, fevereiro 22, 2006

ÀS AVES QUE ATRAVESSAM AS FRONTEIRAS...

Noite após noite a noite continua !
Noite...E nenhuma hélice perdida,
morse de espelhos, reversão de lua...
Só este vento, lágrima mordida!

Da terra seca, súplices acantos,
ergue-se o bronze líquido dos braços
- ó carrossel de pombas e de prantos,
exumação de todos os cansaços!

Erguem-se mãos febris como bandeiras,
cintilações de mudos holofotes
às aves que atravessam as fronteiras
sem carimbos de rês nos passaportes.

Erguem-se mãos, solenes ou crispadas,
nobres ou vis, abertas, entreabertas,
ó floração sinistra das estradas
do turismo das fáceis descobertas!

Erguem-se mãos, ó póstumas estrelas!...
Mas era aos mares nocturnos que cumpria,
onde dormem cadáveres, caravelas,
com moluscos e peixes de vigia,

era lá, ao gerânio dos abismos,
às depressões em fogo, se descesse
a pedir à ternura de algum sismo
que viesse, viesse e que varresse,

que varresse, varresse, ávida espuma,
com sonâmbulos gelos e golfinhos,
turbulência que escombros desarruma
em novas geografias e caminhos,

que viesse, viesse e nos deixasse,
talvez, húmida flor em cada mão,
quando a noite, ferida, madrugasse,
o coração, talvez o coração!...


(Orlando de Carvalho , in "Vértice" de Fevereiro de 1970)

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